domingo, 9 de setembro de 2012

Mário de Andrade e o Nordeste Por João da Mata Costa



No final do ano de 1928, Mário de Andrade visitou o Rio Grande do Norte e
levou o canto e encanto de Chico Antônio para o mundo. “Já estou no RN,
pertencendo ao meu amigo Luís da Câmara Cascudo, e o prazer vai enfeitando
o presepe. Mario fica encantado ao passar por Natal. Me deito depois desse
primeiro dia  de Natal. Estou que nem posso dormir de felicidade. Me entro
na cama e o vento vem, bate em mim cantando feito coqueiro. Pois aqui
chamam de “coqueiro” cantador de cocos. Não se trata de vegetal, não, se
trata do homem mais cantador desse mundo: nordestino. O vento de Natal é
mano dele ... Na noite de Natal, em Natal, Mario assiste a um pastoril de
meninas e um Diana caçadora sem nenhuma Grécia. - a população se deslocou
do Tirol e da Solidão, bairros vizinhos. Os bondes, os autos , as “
dondocas” ( ônibus) vêm cheios. Gente de branco, gente de encarnado, der
azul, moças bonitas ... Junto das barracas do América e do A.B.C, clubes
de futebol, a rapaziada faz um sarceiro gostoso, cantando cocos... “ Oh
mulé, sai do sereno, / Que essa frieza faz mal ... ”.
O relato dessa viagem foi publicado em o Turista Aprendiz.  Em Janeiro
Mário conhece Chico Antônio, que para ele vale uma dúzia de Carusos. “ ai
seu dotô / quando chegar em sua terra/ vá dizer que Chico Antonio/ É
danado pra embolá!” Oh-li-li-ô! Boi Tungão / Boi do Maiorá ...´´. Estou
divinizado por uma das comoções mais formidáveis da minha vida. Chico
Antônio. cantava a noite inteira por uma cachaça, por coisa nenhuma e
passa a noite inteira cantando sem parada. “Que artista. A voz dele é
quente e de uma simpatia incomparável... “ Homem bonito e forte já
estragado com seus 27 anos e muita cachaça. Mário desejou morar em Natal e
encantou-se com as nossas belezas naturais e culturais. O Boi, os catimbós
e as músicas de feitiçaria. Um missivista contumaz travou intensa e
importante correspondência com Câmara Cascudo, organizada incialmente por
Veríssimo de Melo.
Dez anos depois, Mario de Andrade trabalhava no Departamento Municipal de
Cultura de São Paulo. Sob a gestão de Mário foi enviada uma equipe para
coletar a música folclórica do Brasil. Essa viagem etnográfica foi pensada
desde 1926 e tinha por objetivo colher informações do rico repositório
etnográfico que é o nordeste brasileiro.  Por questões políticas Mario foi
afastado do Departamento de Cultura de SP, mas o projeto foi retomado pela
grande pesquisadora Oneyda Alvarenga, que passou 30 anos organizando esse
material coletado. O Xangô e outros cultos afros eram proibidos em vários
estados. Mesmo assim eles conseguiram registrar cerimônia de Xangô, em
Pernambuco, e macumba no Maranhão. Nessa missão foram recolhidos: Canto de
Trabalho, músicas de rezar, cantar e dançar. Um rico material produzido e
idealizado por esse grande brasileiro que sabia valorizar a nossa rica
cultura. Não fosse essa missão muita coisa teria sido perdida. Felizmente
parte desse material foi recuperado e lançado numa caixa de CDs para a
posteridade. Ficamos conhecendo mais o Brasil e suas ricas manifestações
culturais, graças a esse rico projeto que teve na pesquisadora Oneyda a
sua materialização para a posteridade. 
 
na foto: Mário de Andrade (de óculos) em 1936,
entre Cândido Portinari, Antônio Bento e Rodrigo Melo Franco

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